25.6.24

A controvérsia da Filosofia Poruguesa

Confesso que é uma fixação. Talvez por tê-lo conhecido e entrevistado e ter recebido dele uma lição do que é a cultura feita de estudo, a discrição tímida da pessoa, a generosidade do seu ser. Tenho procurado adquirir tudo quanto encontro de sua autoria e tentado ler.

Surgiu de alfarrabista este ensaio, publicado em 1971 pela Espiral, Biblioteca de Cultura Portuguesa, dirigida por António Braz Teixeira, a quem na filosofia do Direito tanto devemos.

É um livro de bondade, porque, centrando-se na autonomia de Portugal, que é a sua segunda parte, toma seu objecto prévio a questão da autonomia da filosofia portuguesa e, para ilustração dos leitores, compendia, em breves citações, todos quantos estiveram pró e contra esse conceito. Sistematiza-os, distinguindo os precursores, a propositor [naturalmente Álvaro Ribeiro], os postuladores e os opositores. E franqueia-nos um cuidadoso índice onomástico e sugestões de leitura.

Interessante, e lido com gosto, é o texto prefacial, escrito com ironia, sob o título Ecos da Terra, relato íntimo da suas origens, a zona raiana de onde é natural, vista, já em adulto, pelos olhos de uma criança.

Conatural à narrativa é o tema da Espanha, não apenas o da contiguidade geográfica mas da diferenciação e mútuo alheamento entre os dois espaços ibéricos. 

Uma frase, até porque típica do estilo da escrita, tudo resume: «Enfim, provado estava que Espanha sempre riu de Portugal, que ri ainda de Portugal, enquanto alguns dos nossos, tomando o riso por sorriso, logo ficam feitos peralvilhos em face de tanto salero, e quase olvidam o que é Portugal». 

E é sintomática a definição [dir-se-ia desnecessária, mas afinal essencial] do que seja Portugal: «uma população, um território, uma psicologia, uma filologia e uma filosofia. Os que são portugueses onde querem, como querem, e porque querem, ou seja, porque sabem em liberdade de pensamento da autonomia (em acto, ou em devir) de Portugal».

Síntese talvez injusta pela generalização, pois há a Galiza, é, porém, retoricamente vocativa de uma reflexão maior. 

Jesué de Pinharanda Gomes foi um filósofo livre e um pedagogo. A erudição é na sua obra, não e oferece como um fim em si, mas instrumento para a sua compreensão do mundo. 

Se a sua escrita nem sempre é linear, é sobretudo explícita, correspectiva à diferenciação que assim enuncia: «A Filosofia é uma arte de explicitação, enquanto a Literatura é uma arte de implicitação».