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1.7.14

A História, do universal ao particular


Concebeu-o como uma biografia imaginária, uma «memória dos outros», escrita por um autor fictício em que se descobre a sua pessoa, a inquietação permanente do seu ser. Atribuiu ao livro toda a possível verosimilhança, de tal modo que o leitor num primeiro instante se interroga se Luiz Cotter, suposto biografado enquanto autor do Esplendor e Decadência da Casa de Áustria, teria de facto existido. Eis o magnífico Sob a Cinza do Tédio, o «romance de uma consciência».
Decidi-me a lê-lo hoje, num intervalo que a mim ofereci, cansado de há que tempos nada ler de livre escolha.
E vim aqui precisamente ao chegar a página 28, passados tantos momentos dignos de serem aqui citados, para trazer aquele instante em que o imaginário personagem atinge a percepção da «absoluta impossibilidade de se formularem leis históricas. A História estudava sucessões e não repetições, era uma ciência do particular e não do geral, procurava o mais típico, o mais individualizadamente dramático da vida colectiva».
Li e revi-me precisamente na profundidade do que dali decorre e quanto se fica isolado ao pensar assim, que «a História não carece do universal, com ser uma ciência do particular». Todo um exército de  doutrinadores e censores se nos opõem, armados até aos dentes com as armas da ideologia e da História fazendo a legitimação das suas doutrinas.

28.5.12

Um coleccionador de angústias

Tão esquecido, desprezado mesmo, à esquerda por ter integrado o governo de Sidónio Pais, à direita pelo seu liberalismo. Em 1944, publicou um livro corajoso a que chamou Cultura Intervalar. Encontrei-o, amarelecido pelo tempo, levei-o comigo este fim-de-semana sem sonhar o que me esperaria ao lê-lo.
Eis ali a sabedoria mansa, sem erudição para convocar autoridade e exibir saber, sem rancor face a todos os outros que assim não pensem.
São textos na aparência dispersos, na realidade unidos pelo fio condutor de um só pensamento, a noção da precariedade do seu tempo, de intervalo entre o mundo de ontem - e vou buscar a frase ao titulo de um livro de Stefan Zweig cujo drama ele pressente e acompanha como o da ruína de um valor ante a consciência da sua vulgarização - e o que sairia da guerra então na sua agonia, se ainda sem vencedor indiscutível pelo menos sem desenho futuro para o novo mundo que se anunciaria após o caos.
Como se uma «arquitectura de emendas da vida já vivida», há nesse opúsculo a melancolia de um pensamento sentido, aí a sua preciosidade. E a noção da relatividade do mundo, a daqueles que não fazem da duração da vida humana o egoísmo «a medida de todas as coisas».
Tenho dele não sei quantos livros. Quando, esgotada a leitura, a terminar, juntar na estante este livro aos que já chegaram e dormitam como sonolentos pombos aguardar o clarear, irei conferir os que me faltam. E tentar achá-los. «Nestes anos de perplexidade crítica deu-se uma reabilitação de ideias marginais», escreveu. Talvez aí nos tenhamos encontrado. Eu e a sua esquecida obra, a sua ignorada pessoa.
Exilado, sabe-se dela mais no Brasil e em Espanha do que na sua Pátria.

19.7.10

O coleccionador de angústias

Regresso hoje aqui com o sentimento de surpresa. Li a esmo o que escrevi. Perguntei-me porque teria saído deste lugar, horto de reflexões. O título deste post fui buscá-lo a um livro de Fidelino Figueiredo. O livro começa e termina com Dom Quixote, o quixotismo forma de angústia mansa, de ilusão risonha em que a idiotice é ingénua sabedoria.
Este blog começou por fazer jus literal ao nome e tratou nos seus primórdios de geometria, problematizando o pensamento a partir daí, como a Ethica Ordine Geometrico Demonstrata do judeu português Baruch Spinoza. Depois caminhou para o território em que a geometria o é naquele sentido em que a palavra vem abismalmente mencionada no Livro do Desassossego de Fernando Pessoa. Trata da filosofia portuguesa e de um modo filosófico de pensar Portugal.
Regressei hoje, o pensamento martirizado de reflexão. Talvez haja alguma sombra em que possa haver  inteligência sem racionalidade nesta silva de enganos em que há quem julgue que só há saber na epistemologia, verdade na ontologia.