20.10.23

Sampaio Bruno: a homenagem em "A Águia", um mês após a sua morte

 


Com quanto júbilo consegui encontrar, em amável alfarrabista, alguns números dispersos da revista "Águia", e entre eles, por sua gentil oferta, um número especial, editado em Dezembro de 1915, dedicado a José Pereira de Sampaio (Bruno), falecido no mês antecedente.

Entre os artigos, logo o inaugural, escrito, em estilo intimista, por Teófilo Braga, a centrar-se na colaboração do autor de "A Ideia de Deus" na edição portuguesa da História de Portugal de Henri Schaeffer. Trata-se da "História de Portugal desde a fundação da monarquia até à revolução de 1820. Vertida fiel, integral e directamente por F. de Assis Lopes. Continuada, sob o mesmo plano, até aos nossos dias, por J. Pereira de Sampaio Bruno", que está editada pela Imprensa Nacional  [ver aqui].

Para além do arroubo de Leonardo Coimbra - que em "Bruno, Filósofo" vê o gládio do ataque ao positivismo e aos seus maus frutos, «o despotismo» -  e de um invulgar apontamento, escrito pelo musicólogo portuense Bernardo Valentim Moreira de Sá [1853-1924, ver aqui], sobre um folheto de 20 páginas, impresso particularmente, em que o pensador homenageado, em 1903, expusera uma teoria matemática dos intervalos, fundada no pensamento de Leibnitz e de Pitágoras sobre a interrelação da música com a aritmética, porventura o mais consolidado é o artigo analítico de Teixeira Rego [1881-1934] sobre "A Unidade de Pensamento em Sampaio (Bruno)", a surpreendê-lo para além da erudição e com maior profundidade do que o seu recato tímido permitia intuir. 

Texto de notável contenção, a considerar o perigo de resumir «em demasia simplista, a obra de um metafísico», quando há em Bruno «místico», mas a deixar, em comovida lembrança, uma síntese que entronca esse problema tão contemporâneo: «como conciliar a existência de Deus com o mal que há no mundo»?

24.9.23

Álvaro Ribeiro e José Régio: o caminho das pedras da filosofia portuguesa

 


É curioso seguir o processo de afirmação da denominada "filosofia portuguesa" através da correspondência trocada entre Álvaro Ribeiro e José Régio, que a Imprensa Nacional publicou no âmbito da edição da obra completa deste último e apreender o tortuoso caminho das pedras que aqueça teve de trilhar até que no ano de 1957 se perfilou enfim o periódico que daria voz ao seu pensamento, o jornal 57, dirigido por António Quadros, que se encontra integralmente digitalizado, aliás, na Hemeroteca [ver aqui], depois da primeira tentativa entre 1951-1952 com a revista Acto.

A 19 de Janeiro de 1947, Álvaro Ribeiro escrevia a José Régio, reconhecendo a influência da poesia deste no pensamento filosófico: «[...] difícil é reconhecer o pensamento português, fazer passá-lo da potência ao acto, ou seja, dar-lhe expressão!», manifestando: «[...] ouso profetizar a nulidade dos esforços de quantos negam a filosofia portuguesa para livremente escreverem filosofia estrangeira ou traduzida».

Mais do que a indiferença, a rudeza com que foi recebido esta sua tese e prol de uma filosofia portuguesa, o isolamento em que se sentiu junto dos que julgarem caminharem a par, conduziu-o ao desânimo. 

A 5 de Fevereiro de 1955, ao ter publicado A Arte de Filosofar, voltava ao seu «caro Poeta [e] bom Amigo»: «[...] com o trabalho que agora publico vou dar por terminada a minha contribuição para a filosofia portuguesa, desanimado e descontente com a incompreensão do nosso público e da nossa crítica. Isto de escrever foi um incidente na minha vida». 

A 28 de Fevereiro de 1957 regressaria com nova epístola, olhando em torno de si, o ambiente adverso, tantos outros timoratos ainda: «Sei que o Delfim Santos nega em público - nas aulas universitários e nos exames de Estado - que existam filosofias nacionais. Sei que o José Marinho hesita e que o Sant'Anna Dionísio hesitou, para não assumirem as respectivas responsabilidades. Não lhes levo a mal essa infidelidade ao ensino de Leonardo Coimbra. Não me envergonho de estar só. Mas se não há filosofia portuguesa, eu, que sou português, prefiro então deixar de me considerar filósofo».

Era já um outro espírito, o revivescer da ideia.

Álvaro Ribeiro teria o gosto de ler o que Régio escreveria precisamente a 21 de Março daquele ano de 1957 em artigo no Diário Popular sobre «A existência de filosofias e de uma filosofia portuguesa».  Texto de camaradagem literária, de estrénua defesa de filosofias nacionais ao lado da filosofia internacional, é sobretudo um repto à serenidade da análise, um convite à leitura das obras do seu amigo e não «morder o homem em vez de analisar o autor».

Felizmente o desespero não o venceu e muitos outros livros se seguiriam, de cunho filosófico, logo A Escola Formal no ano seguinte os Estudos Gerais, em 1961 e o Liceu Aristotélico em 1962 e assim sucessivamente até perto do seu falecimento, que ocorreria em 1981. 

22.8.23

Álvaro Ribeiro: a filosofia portuguesa é possível!

 


Dar tudo por não sabido e remontar às origens. E assim começar com Álvaro Ribeiro [Álvaro de Carvalho Sousa Ribeiro, 1905-1981] e o seu ensaio O Problema da Filosofia Portuguesa, publicado em Outubro de 1943, como estou a fazer, lendo-o num exemplar que o tempo desgastou, para concluir que o caminho é possível, nem que tenham de se reconstruir as pistas por onde se caminhe e que entretanto tantos abandonaram, julgando-as mortas.

Percebe-se a razão pela qual este seu estudo se terá tornado polémico, ao enfrentar o modo como era ensinada então, no meio universitário, a filosofia. E intui-se que isso tenha contribuído para, reactivamente,  nos meios académicos, se ter desvalorizado e até para acintosamente ridicularizado, a proposta que fez de uma filosofia portuguesa.

O livro, de setenta e cinco páginas, é breve em extensão, mas rico em perspectivas. Dir-se-ia um manifesto e foi, de facto bandeira a que tantos outros se juntariam.

Nele aborda-se, de modo crítico, a temática da «filosofia em Portugal», para sugerir uma filosofia que seja portuguesa. Não critica, apenas, propõe alterações concretas, de método e de sistema. E é escrito em linguagem clara.

Para ilustrar o estado da filosofia em Portugal convoca de Sampaio "Bruno" um excerto assertivo do livro a Ideia de Deus - em que o filósofo clama contra a «a indigência filosófica nacional» - Fidelino de Figueiredo - para quem não só não existiria então uma filosofia portuguesa como «a nossa tradição literária [é] tão pouco palpitante de pruridos e de ansiedades filosóficas» e, menos afirmativo, Sant'Ana Dionísio.

Em prol de uma filosofia nacional, Álvaro Ribeiro sugere «recomeçar a tradição», através da acção de um escol - e, para si, «quem diz escol diz escola», uma universidade em que a filosofia deixe de pertencer ao domínio das Letras, para abranger, como suas disciplinas, outros ramos do saber , como as matemáticas, a biologia, a sociologia, a química geral e assim o propôs, então inconsequentemente por falta de regulamentação, o Decreto n.º 5.491, de 2 de Maio de 1919 [rectificado a 10 de Maio], firmado por Leonardo José Coimbra quando foi efemeramente ministro da Instrução. 

Fiel a uma noção «una e trina» da personalidade humana, tratar-se-ia, segundo Ribeiro, de promover o «desenvolvimento do adolescente nos aspectos corporal, animal e espiritual, solidariamente considerados»., um ensino cujo fim autêntico esteja «acima da mera licença legal», adestrado à «formação do homem livre pelo supremo conhecimento da verdade». É-lhe muito cara a noção da filologia como meio de reformulação dos conceitos filosóficos que até aí nos chegavam pro traduções, nem sempre rigorosas, do francês e do alemão.

Se bem que esta concepção de uma nova pedagogia, considerada no pormenor das suas propostas, tenha o se quê de quimérico, o que não se esgotou no tempo foi a concepção de base que lhe está na origem: assim, entre tantas outras ideias, o apelo a um professorado com «vocação autêntica para a missão pedagógica», «o respeito pela diversidade dos métodos docentes», o retomar do discurso oral, da oratória e da eloquência, o seminário como complemento da aula como meio de gerar a adesão  «à ampla tolerância, à «visão dialética, pelo conhecimento das contradições, pela compreensão das almas diferentes, e à afirmação da personalidade própria». 

Mas aquilo que me interessou, por ter sido o que abriu caminho a tantos outros que o tomaram como mestre, foi a constatação da viabilidade de uma filosofia própria do «estilo de pensamento» português. Para a sua constatação sugere «a leitura nova dos documentos teológicos, políticos e literários em que afirmou espontânea e originalmente o génio português, documentos que por não serem especificamente filosóficos, oferecem em toda a ingenuidade um pensamento sincero que o filósofo interpretará à luz actual»., sendo primordial a leitura de obras poéticas «como afirmação autónoma de consciência de relação com o absoluto». Mas não só. Também a religião, da qual «importam principalmente os textos autênticos onde a contemplação mística e a acção missionária se espelham como equivalentes valioso da metafísica e da ética que estão implícitos na filosofia portuguesa».

Em suma, tratar-se-ia de levar a cabo a «missão altíssima da elaboração do sistema filosóficos que, hodiernamente, corresponda às aptidões especulativas do povo português.



17.7.23

A Paixão de António Quadros por Fernando P.


Por se tratar de texto que será publicado na revista Nova Águia não poderia cometer a indelicadeza de a divulgar aqui na íntegra. Ficam apenas três excertos da conferência, intitulada A Paixão de António Quadros por Fernando P., que proferi, tendo como tema o envolvimento de António Quadros com a vida e obra de Fernando Pessoa, que esteve na génese de tantos dos seus escritos de que se revelou, por último, num inédito ficcional, que transcrevi a partir do manuscrito e prefaciei e acaba de ser editado pela Fundação sua homónima. Foi a minha forma de homenagear o centenário do seu nascimento que este ano se comemora.

«A ideia surgiu-me após ter transcrito o manuscrito do romance A Paixão de Fernando P., um inédito de António Quadros, agora editado, e a que chamei, no texto prefacial, romance espelho, porquanto é escrito em decalque à complexa relação amorosa entre Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz: situar o interesse do autor por aquele que se tornou a personagem da sua ficção e nomeadamente por aquela estranha forma de quase amar que se estabeleceu entre dois seres tão antagónicos quanto impossivelmente complementares.

Que se tratava de um longo e persistente interesse de Quadros por Pessoa percebi-o ante uma frase daquele proferida na entrevista que concedeu a Antónia de Sousa, pouco tempo antes de falecer, que «[…] às vezes chego a pensar que o Fernando Pessoa é uma presença de que não me posso livrar», afirmação que levei a pórtico daquele prefácio.

Já quanto a Ofélia Queirós e à relação amorosa com Fernando Pessoa, a percepção intensa só nos surge revelada por António Quadros mais tardiamente, no livro que em 1960 dedicou à vida e obra do poeta, reiterando o tema na edição praticamente idêntica de 1968, na «praticamente outra», vinda a lume em 1978 e, já com substancialmente diverso ângulo e maior amplitude, na variante que publicaria em 1984, intitulada Fernando Pessoa, Vida, Personalidade e Génio.

Para observar o que vos trago, situei-me, como início de jornada, em 1947. António Quadros tem então 24 anos e inicia-se no domínio ensaístico literário com o livro Modernos de Ontem e de Hoje, publicado pela Portugália, no qual analisa a personalidade literária pessoana à luz das Cartas a Armando Cortes-Rodrigues, livro este publicado, em primeira edição, em 1944 pela editora Confluência, com um prefácio e notas de Joel Serrão.

É o ano da licenciatura de Quadros em Histórico-Filosóficas. Considera a obra uma ousadia dos seus vinte anos, a estrear-se da pior maneira possível, ao escrever sobre Literatura. É o ano do seu casamento com Claudina Pó, que ocorre a 8 de Dezembro.

Não se pode dizer que o pensamento de Fernando Pessoa, subjacente a essa sua escrita inicial, lhe seja desconhecido, apenas que não surge ainda com a desenvoltura que atingiria em 1959 e se condensaria em 1960, com sucessivas modificações referidas em 1968, 1978 e pujantemente em 1984, nesse estudo sistematizado sobre a vida e obra de Pessoa, como veremos.

O Fernando Pessoa que naquela primeira data mais longínqua lhe chamou à atenção foi o que evidenciava uma contradição insolúvel entre «o lírico que vê, ouve, observa – sempre pensando – e o pensador que vê, ouve, observa – sempre sentindo.

Contradição entre um homem que olha constantemente para si próprio, que, procurando descobrir as causas, observa os defeitos, observa o que de mais íntimo há dentro de si, se tortura incessantemente, e um homem que sente e, quando sente, não pode deixar de exteriorizar os seus sentimentos – a sua poesia».

É o que, com aguda perspectiva, Quadros qualifica como a «contradição de Fernando Pessoa e Fernando Pessoa», o ser sensível que pensa, o pensador que sente.

Há, por outro lado, nesse ensaio de 1944, a percepção do inevitável tema dos heterónimos, perspectivado numa dupla vertente.

A primeira, para sublinhar, com recurso às palavras do próprio Pessoa, quanto há de sério nesse desdobramento do ser, quanto dos seus principais heterónimos [Caeiro, Reis, Campos] ele havia posto «um conceito de vida, diverso em todos os três, mas em todos gravemente atento à importância misteriosa de existir».

A outra, ao tomar o símbolo, consciente ou inconsciente, imanente à própria heteronímia, afinal o da «frágil consistência da pessoa humana, que pratica os actos mais contraditórios, que tem as manifestações mais opostas, que não pára de evoluir, apresentando sucessivamente aspectos diferentes».

Enfim, fazendo-se eco de uma problemática ainda viva nesse tempo – que o dito neo-realismo trouxera para a agenda e faria perdurar – Quadros, considerando que «o artista não deve fazer intervir em excesso na sua obra os seus ideais humanos» analisa a escrita do poeta que criou Álvaro de Campos à luz do conceito da Arte pela Arte, em oposição à função social do artista. Ante essa dicotomia, Pessoa teria encontrado, segundo ele, o meio-termo, «porque consegue ser ao mesmo tempo, português, humano, artista, pensador, poeta, sem nunca deixar de ser ele próprio».»

[...]

Enfim, aproximamo-nos do tema: António Quadros e a relação amorosa de Fernando Nogueira Pessoa e Ofélia Maria Queiroz Soares, ele tradutor e correspondente comercial, ela circunscritamente dactilógrafa.

Na obra de Quadros publicada em livro sobre a vida e obra de Pessoa, o tópico surge-nos, expresso e detalhado, primeiro em 1960, depois nas versões que foi sucessivamente publicando até 1984, no livro dedicado à vida e obra de Pessoa: tratou-se do que na primeira edição ressalvou ser, não uma biografia e uma interpretação feita «de fora», antes «um trabalho de selecção, escolha, sistematização [dos] múltiplos aspectos de uma vida e de uma obra, desde o ponto de vista da sua própria subjectividade».

Sedo inviável comparar todas as versões, tome-se como referência o texto inicial de 1960 [páginas 33 a 56], publicado no mesmo ano em que Quadros editou o seu livro de contos Anjo Branco, Anjo Negro, e, por contraponto, a versão final de 1984 [páginas 137 a 189].

No primeiro, intitulado apenas Fernando Pessoa, e publicado pela Arcádia, na colecção A Obra e o Homem, emerge, desde logo, a prevenção quanto às interpretações psicanalíticas dessa expressão amorosa e, afinal, da vida sentimental de Pessoa, seja o recurso à teoria freudiana dos complexos e da sublimação dos recalcamentos, socorrendo-se António Quadros da própria apreciação paradoxal que o poeta fez do freudismo em carta a João Gaspar Simões em que parecia, afinal, apreciar precisamente o clínico de Viena no ponto em que pode ser relevante convocá-lo: «o freudismo é um sistema imperfeito, estreito e utilíssimo», escreveu Pessoa nessa missiva de 11 de Dezembro de 1931, ali longamente citada.

Entra então na narrativa de Quadros, a menção ao facto de o amor sexual não avultar na obra de Fernando Pessoa, à excepção de dois dos seus poemas ingleses, Antinous e Epithalamium, que o seu autor considerou serem «nitidamente obscenos», sem que, aliás, suponho, o sejam.

Não que, previne Quadros por uma pergunta que é resposta, que não esteja «Fernando Pessoa – como homem – consciente da realidade feminina, da realidade física, carnal», sim, porque a mulher que ele procura no que a poesia reflecte é «não o corpo, mas a alma distante», afinal «a visão primordial da Mulher essencial, paradigmática, simbólica», seja «o vago anseio, o mesmo sonho da Mulher antiga e linda, da Rainha outrora amada».

É, após esta contextualização, que António Quadros nos apresenta Ofélia Queiroz e as cartas de amor entre «aquela rapariga burguesa e lisboeta» e o poeta, através das quais, considera Quadros, «assistimos a um penoso drama: o drama da impossibilidade de uma substancial união, acrescido da impossibilidade de autêntica comunicação».

A primeira carta data de 1 de Março de 1920. Na altura em que Quadros escreve a sua obra na versão inicial de 1960 não estava ainda publicada na íntegra toda a correspondência.

[...]


«Enfim, o livro quase-póstumo, Estruturas Simbólicas do Imaginário na Literatura Portuguesa, compilação de conferências, publicado em 1992, um ano antes de falecer, no qual insere [páginas 85-111] o que havia sido uma conferência lida no Teatro Olímpico em Roma a 28 de Maio de 1986 e que ampliou, datando do ano 1991 essa versão mais desenvolvida.

Causa espanto, diga-se, que António Quadros não tenha aproveitado tudo quanto já escrevera para assim resolver o tema de uma conferência para italianos, reunindo excertos dos seus livros e artigos dedicados ao tema pessoano. Não: dando mostras de uma vitalidade notável, trouxe matéria nova, aquilo consta deste artigo.

São estes os temas que ali compendia. Pessoa como pensador gnóstico e o Cavaleiro-Monge, Thanatos e Eros ou de Abdicação a Gládio, a realidade imanente e a demanda de uma realidade transcendente, ou seja, os três estados de um itinerário, Pessoa e o corpus mítico-profético português e, enfim, de Camões e Vieira a Pessoa, uma tradição vivaz.

Não será fácil sumariar a riqueza inovadora de perspectivas que resultam desta reflexão, fruto de um pensamento amadurecido de quem, à data, estava em vias de nos deixar.

Tendo começado por referenciar que este percurso tinha como seu ponto de partida o meu envolvimento na transcrição do romance A Paixão de Fernando P. compreender-se-á que me detenha no segundo tópico de entre os elencados, apesar de, na economia do ensaio ser o menos extenso, não ficando aqui sequer um breve apontamento quanto aos demais.

Não porque o aí escrito tenha directamente a ver com a relação sentimental de Pessoa com Ofélia Queiroz, mas porque é por aí, pela grandeza do que ali podemos ler, [nas palavras de Quadros «a experiência perturbante do transcendente», a dialética do animus e do anima», «a cisão dilacerante com que se encontrou ao tomar consciência do seu Si conflitual e praticar constantemente essa intra-análise psíquica»], é assim que se entende definitivamente a impossibilidade em Fernando Pessoa da vulgaridade em que essa relação sentimental com Ofélia, afinal, se traduzia.

É, de facto, no segmento a que chamou Thanatos e Eros ou de Abdicação a Gládio que Quadros aborda a vertente íntima de Pessoa, logo a partir de um fragmento que se supõe ser de 1910, em que o poeta confessa a sua passividade, o seu espírito hesitante, a incapacidade para pensamentos definitivos.

Só que António Quadros vai mais longe e, reconhecendo que uma parte da escrita pessoana ortónima «nos aparece de facto como profundamente ensimesmada, registo de uma desoladora solidão individual, documento tocante de uma sentimentalidade frustrada, projecção de uma incerteza angustiada, às vezes desesperada quanto à vida de relação e até à vida de pensamento», conclui que «a nota mais forte que conseguiu erguer e nos legou é dinâmica, interventora, frequentemente polémica e criacionista».

É no fundo a dialética aristotélica, que Álvaro Ribeiro retomaria, do conflito entre o intelecto activo e o intelecto passivo, variante do conflito entre o masculino e o feminino, o Amor e a Morte, Eros e Thanatos.

É pela auto-catarse dos heterónimos, constata Quadros, que essa tensão dialética se resolve em Pessoa, o que ele ilustra com a comparação de dois poemas antagónicos, escritos por Fernando Pessoa no mesmo ano de 1913, um, auto-sacrificial, de anseio de reintegração, o soneto intitulado Abdicação - «Toma-me, ó Noite Eterna, nos teus braços/E chama-me teu filho…Eu sou um Rei/Que voluntariamente abandonei,/O meu trono de sonhos e cansaços» - e um outro, expressão do génio criador, Gládio - «Deu-me Deus o seu Gládio, porque eu faça/A Sua santa guerra./Sagrou-me seu em génio e em desgraça/Nas horas em que um frio vento passa/Por sobre a fria terra».

Tanto mais haveria para dizer, em extensão e profundidade. Isto foi o que eu consegui».

7.7.23

Da angústia à esperança redentora

 


Ler em 2023 um livro de ensaios de cariz filosófico, escrito em 1956, é, mau grado o hiato temporal, exercício interessante. Sobretudo pela actualidade do pensamento e por tanto que ele mobiliza para a reconsideração do humano e esperança redentora num mundo que não se condene ao caos. É o caso do livro de António Quadros A Angústia do Nosso Tempo e a Crise da Universidade, publicado pela Cidade Nova, revista e editora de cultura, dirigida por José Carlos Amado e publicada em Coimbra, e dedicado a Afonso Botelho e a Orlando Vitorino, dois expoentes do que veio a designar como filosofia portuguesa, no qual o seu autor compila escritos que havia divulgado na imprensa periódica desde 1954 e nomeadamente uma conferência proferida na Faculdade de Direito a 2 de Março de 1956, a convite da Associação Académica.

Se a capa menciona o tema da crise da Universidade como referência, isso resultará da circunstância de a formação intelectual de António Quadros, como de tantos outros dos seus companheiros de jornada, assentar numa formação autodidacta, refúgio possível ante o anquilosamento do sistema de ensino superior, nomeadamente no domínio da licenciatura que então se designava como de Ciências Históricas e Filosóficas, onde se graduou, dominada que estava ainda pelo redutor positivismo. 

A obra, de cento e sessenta páginas - que um lapso na numeração do índice, com um intervalo para menos de quatro páginas não perturba a orientação do leitor - é, porém, mais do que essa reflexão de crítica institucional, aliás construtiva, pois há nela todo um capítulo relativo a Subsídios para uma Reforma da Universidade Portuguesa [página 89] e é pela positiva que a análise carrila ao longo das suas páginas.

Estudo compósito, o livro torna-se interessante por compendiar o que é dito serem «quatro testemunhos da geração de 50 sobre a crise da Universidade e da Educação» [página 57], o que é feito pela menção a quatro livros, de natureza diferenciada, mas irmanados pelo mesmo pendor de originalidade: dois romances, Caranguejo, de Ruben A. e Eda de Eduardo de Azevedo, duas colectâneas de ensaios, uma intitulada Educação e Crítica, de Fausto Lopo de Carvalho e outra O Drama do Universitário, de Afonso Botelho. 

Não se trata, ao contrário do que a referência parece sugerir, de depoimentos dos autores, dos quais apenas o primeiro sobreviveu como nome mais generalizadamente conhecido, mas sim, de apontamentos diria de recensão, redigidos por António Quadros, sobre aqueles livros, nos quais encontra [página 59] «duas formas de repulsa perante uma sociedade em crise, respectivamente pela sátira e pela utopia, não deixando de conter sinais legíveis de possíveis caminhos educativos», mas que convergem no sentido de mostrarem «uma igual compreensão de que o problema fundamental do nosso país é o da educação» [ibidem].

O mote estava, aliás, já dado pelo texto introdutório, no qual se escreve: «Que a cultura portuguesa se coloca num grau muito mais alto, apesar do sistema deficiente de educação e dos meios de transmissão da cultura, é o drama que veladamente palpita nestas páginas» [página 10]. E isso é perceptível.

Se essa avaliação do regime de ensino universitário está hoje situada ao tempo, com difícil, mas não totalmente impossível, translação para os dias de hoje, já a reflexão que dá contexto à análise, essa fica como texto primordial. 

Trata-se de apresentar a «Necessidade, situação e Raiz Filosófica da Cultura Portuguesa» [páginas 15 a 53], onde, através de uma reflexão vestibular de cunho antropológico [sobre «o homem, esse desconhecido», título, aliás, de uma obra de Alexis Carrel], se progride para o tema da nossa «autonomia cultural [página 21], para, enfim, o estudo desembocar no tema da «filosofia nacional  - filosofia actual» [página 28], logo o da «filosofia portuguesa» [página 37] e, enfim [página 46] o da «arte de filosofar.

A perspectiva antropológica situa António Quadros nos quadros do existencialismo de matriz cristã, ancorado no pensamento de Karl Jaspers e Gabriel Marcel, miscigenado, porém, com famílias filosóficas convergentes, quer provindas do existencialismo, como Albert Camus, quer de matriz não inteiramente coincidente, como Unamuno, Ortega y Gasset, ou mais consentâneas, como a de Kirkegaard, não faltando a menção a Leonardo Coimbra, que falecera vinte anos antes, mas cuja obra, controversa foi, e é ainda inspiradora, perdurando como referência fundacional.

Trata-se, no que a essa perspectiva respeita, de apelo à consideração do homem concreto, o homem situado e, como tal, referenciado a um «circunscrito tempo, num circunscrito país, num circunscrito ambiente» e não aquele «homem abstracto: o homem sem pátria, o homem sem história, o homem sem família, sem crenças, sem paisagem» [páginas 17-18].

É este um dos momentos de plena actualidade do livro sobre o qual escrevo.

Reflectindo sobre a arte abstracta «que apenas desvela o mundo das sensações e dos tropismos» [página 18], a literatura, «em que as personagens se poderiam substituir por outras indiferentemente» [ibidem], António Quadros encontra aí o homem uniformizado, o «ser humano impessoal» [página 20], essa abstração desumanizada do que seja Homem, e conclui premonitório, numa pergunta angustiada: «Ora não será possível deter este maquinismo infernal que nos conduz para  uma próxima guerra atómica, porque dentro e pouco, deixando de se pensar nos homens, nos homens concretos, nada importará aniquilar alguns milhões de números, alguns milhões de abstrações, alguns milhões de abelhas?» [página 20].

Sendo esta a antecâmara da reflexão, o núcleo essencial do livro vai no sentido da proclamação da autonomia da filosofia dita «portuguesa», não porque seja uma filosofia em Portugal, sim para Portugal e que cumpra «a transcendentalidade específica do ser português» [página 31].

O caminho vem balizado por nomes que já são marcos miliários dessa forma de pensar e de que refere Amorim Viana, Cunha Seixas, Sampaio (Bruno) e Leonardo Coimbra. 

Trata-se, no seu dizer, de uma filosofia, essa a portuguesa, que «não é racionalista nem é metafísica» e que encontra subjacente às obras de Pascoaes, Régio e Fernando Pessoa, assente na valia epistemológica do símbolo e do mito, com desconsideração - ele diz «desprezo» - pela alegoria e pela metáfora [página 39], um modo de filosofar que «foge ao imanente e tende para o transcendente» [página 40], tenta «a síntese do natural e do sobrenatural» [ibidem], um pensamento, de qualquer modo, «purificado, ultrapassada a vivência emocional e intuitiva» [páginas 41-42], tudo com repúdio da «preponderância das formas menos altas da poesia e da arte, e subserviência perante as doutrinas estrangeiras e, entre estas, perante as mais fáceis e superficiais, como o positivismo» [página 43].

Enfim, até pelo título do capítulo se adivinharia, que «A Arte de Filosofar» tem como referencial Álvaro Ribeiro, cuja obra, segundo Quadros, procedendo embora, de um pensamento fundado em Aristóteles e Dante, por um lado, e Bergson, por outro, segue na linha da tradição portuguesa que havia sido delineada por Bruno, Guerra Junqueiro e Leonardo Coimbra, mas «afirma tal singularidade e tal originalidade, mesmo em relação à tradição que a precede, que não teme romper com os processos lógicos em que geralmente se move a reflexão filosófica europeia» [página 49].

Abre-se, pois, caminho para um «sentido de redenção e de optimismo, que é profundamente grato a um povo atlântico, como o português, cuja epopeia descobridora e navegadora é sinala e símbolo de uma navegação e de uma descoberta mais altas» [página 53]. É, por isso, o triunfo de uma aventura humana, «que não há-de findar no desespero e na angústia» [ibidem], afinal «uma arte de filosofar que precede a arte de viajar transcendentalmente» [ibidem].

Finda um livro, em generosa dádiva pedagógica, com uma interessante lista bibliográfica [página 145], surpreendente em muitas das suas menções, «subsídio» lhe chama o autor, que visa orientar leituras que iniciem para esta caminhada, que urge prosseguir e pode ter ali o seu começo, revisitando os próprios passos, reencontrando-se os vivos com os que ainda vivem, intemporal o espírito, eterna a alma.


28.5.23

António Quadros: pensamento como vida


Fica aqui o texto da minha intervenção ontem, dia 27 de Maio de 2023, no Colóquio de Homenagem a António Quadros, que teve lugar na Ericeira, sob o patrocínio do Instituto de Cultura Europeia e Atlântica e da Fundação António Quadros.


Falar sobre António Quadros quando se tem a meu lado António Braz Teixeira, ronda o inútil e o atrevido.

Inútil, pois não posso acrescentar mais estando diante quem o conheceu intimamente, estudou pormenorizadamente a sua obra e tem a sabedoria de a saber enquadrar no âmago das várias vertentes em que se nos apresenta a denominada Filosofia Portuguesa.

Atrevido, porque é contrapor a tudo isso a minha ignorância e ela tornar-se ostensivamente visível.

Hesitei, pois, quanto ao que poderia dizer e resta-me, enfim, aquele porto seguro de falar, também eu, do António Quadros que teve reflexo na minha formação, como já me foi permitido que o fizesse quando do colóquio que teve lugar na Universidade Católica, a propósito dos 90 anos do seu nascimento e 20 da sua morte [1].

Com esta ressalva, ficam estas palavras. Comecemos pela pessoa, e nela, a sua face visível.

Não é irrelevante conhecer dos pensadores a pessoa que pensa, o facies, o rosto e o olhar.

Por maioria de razão isso aplica-se a António Quadros, António Gabriel de Castro e Quadros Ferro de seu nome.

João Bigotte Chorão [2] surpreendeu-lhe a alma pelo rosto, «um rosto de criança», um rosto «só no fim turbado pela doença e pela melancolia de projectos truncados» e caracterizou, com mestria, o ser social, «homem de paz em tempo de guerra, homem de convívio em tempo de solipsismo, homem no diálogo no deserto do monólogo, homem de acção na apatia da inércia».

Gilberto de Mello Kujawski, que o conheceu num congresso, diria [3]:

«Quando foi anunciada a sua presença, ele surgiu a meus olhos como um homem vertical, de palavra viril e acento profético […] A lealdade era o traço dominante no carácter de António Quadros. Lealdade aos vivos e aos mortos, compromisso sacramental com o passado e com o futuro da pátria lusitana»

E tantos outros testemunhos de conhecimento directo se poderiam convocar.

Abel de Lacerda Botelho [4], por exemplo, focado numa das vertentes do seu pensamento espiritualista disse:

«António Quadros, pela sua personalidade, pela sua obra, pelo empenho na vida de cidadão comum, de escritor e de filósofo, que foi, ele bem pode ser considerado o exemplo do missionário do Santo Espírito Santo»

Para além disso, houve um António Quadros familiar e social, jogador de ténis e de espaços de élite cosmopolita.

Num fascinante texto solto sobre seu pai, a escritora Rita Ferro entrega-nos desse ser invulgar um retrato de que cito apenas um breve excerto [5]:

«Era um homem bizarro: inquietava-o o enigma do Ser, falava de Cristo com admiração, exaltava-se com a Poesia e levava a sério as crianças […] vestia-se como os outros para não dar nas vistas, falava em voz baixa numa língua estranha, contrariava os seus instintos até ao limite, e aprendeu tudo o que havia a aprender na vida para experimentar sozinho a dor da limitação humana. Ao mesmo tempo que se deixava arrebatar pelas pedras e pelas árvores, teve amigos feios, com caspa nos ombros e gravatas amarrotadas. Era tão crédulo e infantil que comovia: alugava a primeira casa que lhe impingiam, subscrevia revistas para ganhar o relógio digital, e passava cheques aos amigos sem qualquer apreensão; no fundo, no fundo, achava que o dinheiro era um trambolho. Estava-se borrifando para que os livros se vendessem pois não tinha pressa».

Ante a extensa obra publicada e o que, amorosamente, sua filha Mafalda Ferro conserva, como espólio, nos arquivos da Fundação, com sede em Rio Maior, imagina-se a vida de António Quadros resumida à sua escrita, esta a tradução do seu pensamento.

Não é assim, porquanto estamos também ante um pragmático da acção.

António Quadros não se quedou pela especulação abstracta, antes verteu o pensamento na obra escrita, a qual foi acumulando ao longo dos anos, a essencial de cunho filosófico, mas também no domínio da ficção e da poesia, para além do biográfico em que assume relevo maior o que escreveu sobre a vida e obra de Fernando Pessoa.

É certo que, retomando as palavras de Jesué Pinharanda Gomes [6] «a biografia pública de António Quadros coincide com a sua biografia íntima: uma vida de reflexão, uma vida a escrever, a comunicar».

Mas não só aí.

Foi uma constante do seu modo de ser, assumir iniciativas editoriais pelas quais o pensamento do sector a que se ligava, e era, afinal, a sua família espiritual, também pudesse encontrar modo de expressão, forma de dádiva e entrega aos outros.

Assim entre 1951 e 1952 animou, com Orlando Vitorino, a revista Acto, subtitulada como Fascículo de Cultura; entre 1957 e 1962, agora reiterando a parceria com Vitorino, Afonso Botelho e Fernando Morgado, dirigiu o jornal 57, Movimento de Cultura Portuguesa; entre 1964 e 1967 assumiu os destinos da revista Espiral, de que foram editados 13 números. Entre 1988 e 1989 integrou o Conselho Patrocinador da revista Leonardo e, enfim, entre tanto mais, foi responsável pela Biblioteca Básica do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa nos dois últimos anos de vida, entre 1991 e 1993.

Homem de ideias, filósofo por intrínseca natureza, António Quadros foi igualmente homem de acção e, ao contrário do que é paradigmático em relação a uma certa noção do que seja o ensimesmamento do filósofo, teve relacionamento público, vida social, e convivialidade.

E assim, foi fundador da Sociedade Portuguesa de Escritores, tendo pertencido a uma das suas direcções.

Trabalhou nas Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian, ideia notável de Branquinho da Fonseca e Domingos Monteiro, lançada em 1958, entidade de que foi inspector, e director de serviços até 1981.

Foi eleito como sócio correspondente da Academia da Ciências, em 1985 e em 1990 da Academia Brasileira de Filosofia.

Fez parte da Direcção do Círculo Eça de Queiroz, de que seu pai, António Ferro, foi fundador.

Foi vogal da direcção da Fundação Lusíada.

Criaria em 1969 o IADE, escola de formação do que mais contemporâneo poderia haver no domínio da Arte, sim, mas também de áreas ao tempo inovadoras, como o marketing e o design.

O resultado de todo este afã não ocorreu como mera sobreposição ao seu pensamento, pois cada um dos segmentos dessa sua intranquilidade fazedora é iluminada pela sua visão sobre a vida, simbiose entre a Natureza e o Humano.

Dir-se-ia ser António Quadros um caso de pensamento tornado acção, mas é também, como com rasgo entendeu Afonso Botelho [7], um caso em que «a actividade febril do seu quotidiano nem sempre nos permitia suspeitar quanto ele foi progredindo na aceitação interior das obrigações de verdadeiro missionário do espírito».

Procuremos, ante este ser excepcional, ainda que para um recorte superficial, esse homem plural, retomando o tema do seu ser activamente pensante, o pensamento em movimento.

Segue um breve apontamento sobre o que me foi dado entender sobre o seu filosofar e sobre a lição de vida que nos trouxe.

Tem raízes claras assumidas o seu pensamento filosófico, mas, no entanto, há que sublinhar não ser linear, menos ainda homogéneo, antes um pensar em permanente evolução, filosofia do movimento e movimento, a fazer-se até ao patamar da sua consolidação.

Nisso António Braz Teixeira teve a lucidez de lhe delinear os momentos significativos, historiando-os [8] e encontrando no seu percurso «dois caminhos complementares e convergentes»:

«[…] o de uma Estética cujas categorias partiam do concreto e da fenomenologia da Arte portuguesa, em especial da arquitectura e da literatura, e de uma aprofundada reflexão sobre o seu radical elemento simbólico, o de uma Filosofia da História de feição teleológica e escatológica, em que desempenhava papel essencial uma Teoria ou Filosofia do Mito, tendo, porém, aquela e esta sempre Portugal como referência directa e permanente» [9].

António Quadros tornou-se «o rosto visível da filosofia portuguesa desde 1957». Rosto visível, escreveu Pinharanda Gomes [10] porque foi «o primeiro a dar a cara, nessa longa e ainda persistente polémica nacional sobre a existência ou inexistência de uma filosofia portuguesa».

Estudá-lo é ir, pois, ao encontro do que seja essa denominada filosofia portuguesa, realidade diversa de uma filosofia em Portugal ao ser território construído sobre especificidades temáticas portuguesas e não apenas pensamento de portugueses sobre temas em que se não revê a identidade de Portugal.

É de facto expressão que considero feliz dizer que António Quadros foi o “rosto visível” da filosofia portuguesa. Não vai nisso demérito para a originalidade do seu pensamento, nem para o do largo caudal de pensadores que dessa corrente se reclamam ou nela devem ou podem ser inseridos, sim a valoração da circunstância de a sua visibilidade social e a sua produção escrita e oral ter dado expressão pública ao que de outro modo se ficaria por tertúlias discretas ou obras valiosas, mas com circulação restrita.

Que tal corresponda a uma realidade perceptível evidencia-se no momento em que a 29 de Junho de 1991 encerrou em Vale de Óbidos o livro Memórias das Origens, Saudades do Futuro, que seria editado no ano seguinte, o anterior ao seu falecimento, no qual sistematizou, mais do que escritos esparsos, afinal, a expressão das grandes correntes que confluem para [palavras suas] «criarmos um mundo outro, uma civilização do espírito pelo descobrimento do ser pleno do homem» e foram estas as ideias marcantes do seu itinerário de vida.

Mas há que perguntar: o que será, afinal, a dita filosofia portuguesa?

Eis uma questão que se mantém actual, saber se existe uma filosofia que se possa considerar, em espécie particular, uma filosofia nacional portuguesa, ou se, pela sua própria natureza universal [11], o pensar filosófico se caracteriza pela extraterritorialidade.

Algo tenho por certo. É que não pode prescindir-se, no pensamento como na Arte, nesta como do mundo dos valores, éticos ou jurídicos sejam, do carácter específico de cada entidade nacional. Indissociável, por exemplo, o pensamento nietzschiano da zona territorial germanófona, assim como impossível supor o pensamento socrático, na sua génese, para além da Grécia de onde surgiu ou o pragmatismo de um Charles Pierce fora do contexto sociocultural norte-americano.

Haverá, pois, «modos de filosofar» diferenciados consoante o espaço geográfico-cultural, e não poderá desconsiderar-se «a raiz antropológica da própria filosofia», porquanto «a filosofia é sempre dum homem ou de homem, duma raça, duma nação e exprime-se numa determinada língua» [12], como o exprimiu João Ferreira.

Para além disso, nem todos os temas de matriz filosófica são intemporais, nem o é a própria ideia de filosofia como realidade intelectual autónoma. Pense-se no acantonamento a que esteve confinada a noção de filosofia durante o tempo do positivismo, claramente ao início do século vinte, como que condenada como excrescência passada que o cientismo havia ultrapassado; e contra isso se bateu António Quadros.

E, por ser assim, o tema de haver uma filosofia portuguesa é questão com autonomia e significação.

Problema, é, porém, o que lhe ditará a especificidade e essa tem sido encontrada nas características paradigmáticas dos portugueses, aquilo que Teixeira de Pascoaes apelidava, e deu título a um seu pequeno livro, A Arte de Ser Português.

E, a seguir uma tal via de análise, têm sido enunciados como particularidades relevantes do português e assim pressupostos dessa filosofia portuguesa, entre tantas outras as seguintes:

-» ligação à terra natal e às suas origens, mesmo quando idealizadas por adopção

-» culto da ancestralidade e, assim, das tradições

-» religiosidade mesclada de paganismo no culto das efemérides

-» espírito saudosista, alma expectante e fatalismo ante o devir

-» grandiloquência contraposta ao pessimismo auto derrogatório

-» natureza aventureira e efabulatória

-» emotividade primária e lírica a descompensar a racionalidade

-» pragmatismo na concepção, operosidade na realização, relutância à abstração

Admitindo, para já, como hipótese de raciocínio, que esse seja o método e que, assim, a filosofia portuguesa é a que se configura e, como tal, se adapta, ao modo de ser português, abrem-se, desde logo, uma séria de sub-questões, logo a mais evidente a de saber se isso não valeu apenas para certos períodos históricos e logo perdeu validade com o devir da História, com a circunstância de outros portugueses e outro estilo de portugalidade surgirem com as suas idiossincrasias e outras particularidades.

É que, olhando para o que se recolheu como sendo essas características individualizadoras dos portugueses, em muito comum aos galegos – a abrir, aliás, a via para a bandeira Portugal/Galiza, uma só Nação – haverá quem, na contemporaneidade se possa perguntar, e com legitimidade para o fazer, se muitas dessas particularidades, corresponderão ao que se colhe no dia a dia, pelas ruas e pelos meios de comunicação de massa como sendo a faceta perceptível do português de hoje.

É esse um dos contextos problemáticos em que assenta a filosofia de António Quadros. A não nos reconhecermos, enquanto povo e assim Nação, em algo que nos individualize, a perenidade desse modo de ver e de ser estará em causa.

Sucede que nessa demanda da lusitanidade importa olhar mais longe do que essa amostra limitada que a vida corrente oferece, sobretudo a urbana, ademais a de certos extractos descaracterizados da sociedade portuguesa, produto de uma adulteração cultural provinda de fenómenos de massa, instigados pelo consumo, superficiais na sua essência, estrangeirados no pior sentido do termo, aquele em que se soterra a nossa valia histórica, o valor da nossa cultura.

Haverá, sim, de procurar-se o máximo denominador comum que permita, juntando o urbano ao rural, alargando a todas as classes sociais e recuando algo no tempo, determinar uma mediana de características de personalidade e de modos de ser do que será “temperamento português”, tal como o surpreenderam etnólogos e caracteriologistas sociais, nestes incluindo os que o expuseram através da ficção, da poética e da Arte. E que existe e subsiste.

É este o contexto em que se move a obra de António Quadros e levou a título de um dos seus estudos, A Arte de Continuar Português [13] e onde orientou a sua vida intelectual.

António Quadros foi dos que cedo entendeu que os estudos jurídicos não seriam o caminho a seguir, pelo que se licenciaria em 1948 no que então se designava como as Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras em Lisboa, mas também aí para se distanciar e de forma crítica do ensino que ali era ministrado, excepcionando o magistério de Delfim Santos [14], este discípulo desse gigante do pensamento que foi Leonardo Coimbra.

Miguel Real [15] encontrou três momentos nos cinquenta anos de labor filosófico de António Quadros, o primeiro de natureza existencialista, o segundo de cunho nacionalista e o último de matriz providencialista.

Existencialista é claramente a sua primeira fase, de um existencialismo que, pela sua vertente religiosa se afasta daquele que se popularizara com os escritos de Jean-Paul Sartre e de Albert Camus, mas que se entronca, no que a António Quadros respeita, numa linha de pensar em que estão presentes os elementos da sua religiosidade católica, fé que lhe ressurgiria em 1961.

São característicos deste período os livros Introdução a uma Estética Existencial, Ensaio de Estética [Portugália, 1954], A Angústia do Nosso Tempo e a Crise da Universidade [Cidade Nova, 1956] e A Existência Literária, Ensaios Literários [Sociedade de Expansão Cultural, 1959].

Num texto de cunho autobiográfico [16] que levou como prefácio ao livro do sacerdote jesuíta Ismael Quiles [17], Sartre e o Existencialismo vistos por um Filósofo Católico [Arcádia, 1959] a sua sedução pelo existencialismo decorreu de, pela primeira vez ter encontrado:

«[…] o homem. O homem em sua majestade e seu drama. O homem concreto, definido, situado; não um ser abstracto, não um ente […]».

E remata, em ruptura com o que era a visão filosófica de reputados mestres:

«Diante da elaboração crítica de Kant, do panteísmo sistemático de Espinoza, do espiritualismo absorvente de Hegel, eu – com o meu nome, meu problema, minha língua, minha pátria, minha modalidade de ver e pensar – não era ninguém. Agora era tudo. A partir do ser eu, com todas as implicações fenomenológicas e existenciais da subjectividade, a filosofia já não era algo de exterior, dogmático e intocável, a filosofia era apenas o que eu dela quisesse fazer: a verdade era atingível, mas a partir da minha experiência vital. Tudo o mais era história»

Como se verá, situado neste modo de pensar, António Quadros não se quedará pelo individualismo que era imanente a esse modo de pensar, essa egolatria, de exacerbação do eu, antes integra-a num contexto mais vasto, onde se situa, como limite, a noção de pátria, «esse aqui-agora, um espaço-tempo», a operar como «factor mediativo» e constituída «nos complexos linguísticos, espácio-temporais, históricos, culturais».

Nasce aí o conceito de patriosofia, em cuja génese esteve a interiorização de uma pulsão nacionalista, um espiritualismo histórico que serve de fundamento à sua interpretação da História.

Surgem, com este pendor obras suas como O Movimento do Homem, Ensaios de Filosofia da História [Sociedade de Expansão Cultural, 1963], O Espírito da Cultura Portuguesa, Ensaios Literários Histórico-Filosóficos [Sociedade de Expansão Cultural, 1967], Teoria da História em Portugal, Ensaio de Filosofia da História e Antologia [dois volumes, Espiral, 1967 e 1968].

Enfim, o providencialismo, visão messiânica e projecto áureo, assim esperançosa de um futuro para Portugal, ideário que se lhe impõe como necessidade salvífica face aos tempos conturbados que então se vivem ante o desordenado período revolucionário de 1975, perdido o Imprério, e que viria a verter, em verso, no poema Ser Profundo, Ode [Espiral, 1980] e consolida, no estudo Poesia e Filosofia do Mito Sebastianista, Ensaio de Filosofia e de Mito [dois volumes, Guimarães, 1982 e 1983] e, enfim, na obra que deixou incompleta em vida, ao faltar-lhe o terceiro volume, publicado postumamente, Portugal, Razão e Mistério, Ensaio de Filosofia do Mito e Símbolo [dois volumes, Guimarães, 1986 e 1987]

Só um Homem da Literatura, como João Bigotte Chorão [18], poderia caracterizar, em síntese feliz, este encontro de António Quadros com um pensamento de matriz patriótica:

«Grande mérito de António Quadros foi o de reconciliar-nos com a ideia de Portugal, sem chauvinismo nem nacionalismo estreito, e o de propor, direi mesmo de impor, contra a ditadura positivista, racionalista e materialista, mestres que encontrou fora da Universidade e dos quais se fez discípulo e exegeta».

De fervor patriótico se tratava nessa busca sobre os fundamentos de Portugal.

Já António Braz Teixeira, escreveu [19]:

«Deste modo, a demanda filosófica e existencial de António Quadros conclui-se numa Patriosofia, numa tentativa, infelizmente inacabada, de hermenêutica da razão de ser de Portugal, que concebia como razão criacionista e teleológica que contém em si um projecto áureo de realização da humanidade»

Entendem-se agora as palavras de Dalila Lello Pereira da Costa [20]:

«Pelo seu amor a Portugal, a António Quadros foi concedido tocar o Mistério intocável desta nossa pátria e traduzi-lo no seu conhecimento, em palavras humanas, transmitidas a todos nós, portugueses»

Na última entrevista que concedeu a Antónia de Sousa, e que foi publicada no dia 11 de Março de 1993, poucos dias antes de morrer, a 21 desse mês, António Quadros lamentava-se que os portugueses «não dão uma chance a Portugal. Põem Portugal no banco dos réus e condenam-no». E rematava, perguntado sobre «que mensagem gostaria de dirigir aos Portugueses»: «Acreditem em Portugal, porque Portugal está no mais fundo de cada um de vós e sem Portugal sereis menos do que sois».

Mas é uma busca sobre o travejamento simbólico da Nação dos portugueses, aquilo de que trata esta parte da sua obra, cuja desocultação não é fácil por não ser directamente apreensível, antes a exigir iniciação e por isso o seu fascínio e sua devoção pela obra poética de Fernando Pessoa «seu aliado», e pela Mensagem, que é a expressão de um «conceito transcendental da Pátria portuguesa» [21].

E por falar em Homem de Letras, vamos ao encontro dessa natureza literária de António Quadros, que não é uma outra natureza, sim forma de expressão das suas ideias.

Se António Quadros não se esgotou na escrita ensaística, não lhe sendo estranha a poesia, também a ficção literária foi forma de expressão do seu pensamento.

É impossível deixar aqui mais do que uma breve nótula sobre esses seus livros.

No domínio da ficção, o género que parecia ser preponderante na obra de António Quadros era o que se traduzia em contos, logo o Anjo Branco, Anjo Negro, publicado em 1960, com uma segunda edição em 1973, as Histórias do Tempo de Deus, saídas em 1990, não podendo desconsiderar-se, porém, a história para crianças Pedro e o Mágico, publicada, em primeira edição em 1973 e reeditada posteriormente.

Anjo Branco, Anjo Negro, editado pela prestigiada Portugália, dedicou-o ele ao pensador romeno Mircea Eliade, ao contista Somerseth Maugham, ao filósofo, seu inspirador, Álvaro Ribeiro ao pintor Salvador Dali e, enfim, à Mulher Eterna, «fonte de vida, que no desenho do espaço e no ritmo do tempo, inlassàvelmente e com beleza de no momento excepcional, ensaia uma transcendência e invoca uma reintegração que do Homem esperam a palavra retardada e conclusiva».

São oito contos, «breves histórias lhes chama o autor», desiguais no estilo, mas em que me interessei menos pela narrativa, mas mais pelo que subjaz à mesma, uma ida ao interior da alma humana, em maior profundidade que o mundo das ideias e o universo dos sentimentos.

Assim em O Vestido Cor de Terra, porventura o menos conseguido, logo a terminologia esotérica a surgir como realidade mais evidente, a oferta de Ricardo a Marta é «solene e iniciática», tudo se move em torno da valia do «mistério» a tal ponto que, ido este, «tudo acabara», numa história em que ele só a possuirá quando já não recear os outros, apenas quando estiverem «sós no mundo», sendo impossível «viver-se sem o conhecimento mútuo dos mínimos recantos da alma, cada um com o seu enigma indizível e intocável».

Num outro registo, ocorre a quase doença mental de Margarida, em A Alma da Casa, e a busca incessante de um lar, de casa em casa, porque todas as casas «são casas sem alma», conto em que irrompem os elementos primordiais «o fogo, o fogo que purifica todas as coisas», pois, casal condenado ao inviável, já têm «a árvore que é a natureza erguendo-se para o céu, que é a escada por onde a nossa alma poderá subir para contemplar tudo quanto é eterno e é divino».

Estranho na sua complexidade, o que se escreve em A Rosa Mística, «história para homens», escrita na expectativa de serem lidas «por mãos masculinas», relato de dúvida e angustiosa incerteza, o encontro, ela debruçada sobre flores, «o corpo imaterial de uma ideia» e o amor, um amor transumano, «devíamos amar-nos todos uns aos outros, amar-nos tanto e com tanta beleza que viéssemos pouco a pouco a formar um único ser, um só ser, e esse ser seria Deus», amor universal «pense que uma árvore também brota de um encontro, de infindáveis encontros, do amor entre a semente e a terra, do amor entre a raiz e as mil fontes de vida que se agitam aqui, invisivelmente».

A Virgem da Montanha é, na sua brevidade, um momento de sensibilidade criadora, a gravidez da meretriz, que «todos os homens a tinham fugazmente possuído – e nenhum a possuíra verdadeiramente», a virginizá-la novamente, como se, porque agora Mãe, retornasse à a um «universo fresco, intacto e maravilhoso da luz, do bem e da verdade», purificada e Mãe simbolicamente bíblica, mas morta agora a sua cria, o seu Jesus, às mãos da cólera da populaça. Está aqui plasmado o maravilhoso da criação, «o movimento que nas entranhas lhe vinham sendo há dias um mistério insólito», o movimento que «fazia do seu corpo o ser que antes não fora, o ser criador, o ser abençoado, o ser propagador, a mãe, esse enigma promissor de Deus».

Vivendo em mundo onírico, trazida pelo enigmático conto O Pesadelo, Onix, nome de pedra mágica que capta as energias maléficas, ali figurada, perseguida por árvores cuja transparência era a maior arma deste novo inimigo, caminhando e caminhando até «à ultima fronteira do cansaço», para o lugar onde um divino Ele, algures, a aguardava e Beatriz, quotidiana e real, quase vulgar, morta em acidente, e Manuel, brevíssima aparição, qual príncipe encantado que a despertará do sono eterno, Onix, enfim, «o sorriso da terra e o seu cântico de alegria» a fazer «florescer as planícies, as montanhas, as próprias rochas dos mais altos picos».

Há em O Segredo uma profusão de referências que torna o conto um dos mais profundos em significação e por isso inviável trazê-lo aqui em detalhe.

Em O Labirinto ou o Fim da Saudade está «a saudade, a saudade do mundo, a saudade do que não fizera, a saudade do que poderia ter feito, a saudade de todos os seres que sucessivamente fora, a saudade do que poderia ter sido, a saudade do amor», o «amor como predestinação», «saudade de um amor que não havia, saudade de um amor desumano, saudade de um amor transcendido».

Enfim, as Metamorfoses, o anseio por mais, o anseio pela totalidade, pelo triunfo do espiritual sobre o material, «não podemos querer menos do que a pátria, não podemos desejar mais do que o império do espírito sobre a humanidade inteira», testemunho de ganas de viver, sobrevivendo, Vergílio «libertava pouco a pouco em si a ideia de que estava morrendo, podia renascer novamente para começar outra vez», começar em «metamorfose total», tudo sentido e assim apreendido, pois «não se pensa só com a razão».

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Assumido ainda na forma de contos, já o livro as Histórias do Tempo de Deus, obra galardoada com o prémio de Novelística da Casa da Imprensa e com o prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências, é tido como uma obra significativa do ressurgimento da fé religiosa na alma do seu autor, sendo, porém, muito mais do que isso. Dedicado a seu irmão «o Fernando, meu irmão, longe mas sempre perto», e cada um dos seus contos dedicado a um dos filósofos seus fraternos companheiros, o livro é enriquecido com uma análise minuciosa e profunda de José Antunes Ferreira.

São deste as seguintes palavras:

«É que, se a arte poética de A.Q. [António Quadros] pretender, como pretende, o desocultamento das potências anímicas do homem e de suas ramificações cósmicas, ela há-de pertencer sempre ao âmbito duma arte elevada e, se conseguir libertar a alma dos Portugueses do que nela há de tosco, de intolerante, de servidão, visará sempre salvaguardar a nossa liberdade e a liberdade, independência e segurança da nossa Pátria».

São sete narrativas, diversas, mas em todas elas, para além da história, momentos reflexivos filosóficos.

Logo o primeiro, intitulado A Palavra, dedicado a António Telmo, o médico e o doente mental com o qual se identifica, o saber-se «o que é um homem», onde estará no seu corpo «o órgão da liberdade», onde encontraremos nele «a matéria do sonho» ou «de que glândula extrai ele o poder de escolher».

Em O Mar, dedicado a Agostinho da Silva, surge, ainda que em aparente prosa, a declamação lírica, navegante: «O ouvido, em tensão, abre-se como um grande búzio de carne, ao inefável da noite, da distância, do pressentimento, da silenciosa voz nocturna, e eis que a natureza, surpreendida em seu recolhimento original, se interioriza e se vem cifrar na mais subtil percepção».

Diverso o registo, em O Pai, com dedicatória a Luís do Espírito Santo, camarada no grupo 57, está uma história de errância, a esgotar-se no reencontro com a Mãe, tornada de corpo em aluguer em alma de todas as mães e «repentinamente a pureza»,  a «uma explosão de alegria, irreprimível e imensa», a transformar «a dor desta noite interminável na graça de uma dádiva infinita, que lhe abria diante dos passos um mar de luz e de amor», «através da formulação de uma palavra secreta e reconfortante, capaz de reconstituir e regenerar a queda no desgarramento da individualidade abandonada», como se «para lá da alegria e da dor de viver, enigmaticamente o atravessasse, o possuísse, o transcendesse a graça universal do movimento, que une todos os seres na mesma demanda».

Dedicado a Francisco da Cunha Leão, A Aventura, história de ensimesmamento, isolamento, uma vida vivida «num mundo contingente [em que] só a morte continuava a não o ser», em que «viajar surgia-lhe de súbito, não tanto como um prazer, mas como a esperança de uma mocidade perpetuamente renovável», o «despertar cada minuto para a curiosidade do minuto seguinte. Posse do espaço, anulação do tempo», a busca do sentido da vida, enfim «a alegria de estar vivo, e de poder viajar, e de poder também regressar. Mas não seria propriamente um regresso, porque nunca se regressa».

Império, dedicado a Avelino Abrantes, outro companheiro da jornada editorial dos 57, é, na singeleza da sua narrativa, a parábola bíblica do regresso do filho pródigo, o contexto empresarial, o contraste entre dois irmãos e assim de dois mundos e a amarga lição de que «a maior ambição dos homens é reencontrar a sua alma, e isso só o poderão fazer a partir da liberdade pela qual são eles próprios, indivíduos patéticos em busca de uma personalidade que julgam encontrar na ficção social, e por isso são destruídos. Aqueles que tudo querem reduzir aos factores económicos, muito longe estão de conhecer a natureza humana…»

Penúltimo conto, tremendo de angústia existencial, No Tempo, Revelando o Tempo irrompe em torno da música de Bach e em torno dela a filosofia do movimento, pois «Bach não é só queda e fuga, e logo acção e movimento, contraste de aporias que se reúnem, que resolvem a contradição, que mutuamente se sondam»,  e a partir daí, em torrente «as fontes irradiantes do movimento, o ímpeto mental que se revela neste tempo múltiplo, heterogéneo, rico de significação»; e o desejo, «o alívio e uma vaga saudade do corpo que não chegara a possuir, mas em parte conhecera, da alma que julgara compreender mas que lhe insinuara no espírito a mais desconfortável dúvida, não sobre ela, objecto, mas sobre ele sujeito», a dúvida sobre «se o amor vem antes ou vem depois, se o amor cria a solidariedade ou apenas a exprime». E tanto mais!

Enfim, «ao José Santiago Naud», poeta e professor, fundador da Federação Espírita brasileira, Ao Longo da Nave, é a tragédia da agonia, lembrança da viagem que foi viver, a voz da memória, a lembrança de todas as camas dos seus sonhos, a cama de infância «nau de corsários» inventados, depois o «lastro inútil do meu dia de advogado», «o homem tem uma besta a devorar-lhe os flancos, que se chama privação», «com o meu pequeno saber de homem de leis, julguei em tempos que uma nova lei, um novo código, uma reversão de homens e valores … Mas a privação vai até ao âmago do mais fundo e essencial do ser humano».

E Deus, a angústia sobre Deus, a nave em viagem, «envolta em negrume, como este quarto, como esta cama», «uma igreja é uma nau que vai pelo mar universal à procura de Deus, que leva já Deus consigo nos mastros, no porão, no leme, no coração dos marinheiros, na face enigmática do capitão, nau que domina a natureza, quilha a escorrer água que se eleva e inverte à luz de virais, entrando num outro espaço e num outro tempo […]».

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Mas não foi apenas na novelística em forma de contos que António Quadros nos trouxe a evidência do seu ser, também no romance e por uma forma muito particular.

Não há nesta vertente da sua escrita a por vezes clássica soma extensa e intrincada de personagens, nem o registo temporal diferenciado ou a acumulação de pormenores descritivos que são característicos frequentes de obras com esta natureza. Com ele tudo é simples e, no entanto, complexo.

Nesse domínio romanesco tínhamos apenas Uma Frescura de Asas, obra vinda a lume em 1973, até ter sido achado no seu espólio um inédito, que intitulou A Paixão de Fernando P., a que aludirei em breve. Há também a ideia de O Segredo Perdido, romance que anuncia como «obra a publicar» na folha de guarda do seu livro de poemas, que adiante se referirá, intitulado Viagem Desconhecida, publicado em 1952, onde igualmente dá conta da intenção de editar um livro que se chamaria Teatro Trágico, em um volume, no que se incluiria a peça Asa Negra, em três actos. e A Barca do Silêncio, com igual número de actos.

Uma Frescura de Asas é, sob o aparente registo ficcional, um relato dos últimos dias de vida do filósofo José Pereira de Sampaio, conhecido pelo pseudónimo “Bruno” [22], retido num leito de hospital, a rememorar as limitações que a doença lhe trouxe, o pudor e a vergonha ante a uma situação amorosa que se sentiu incapaz de consumar, e angústia final de uma fé religiosa que repudiara, mas que se lhe apresenta, sedutora, junto ao leito que é já o da sua morte física.

Há neste registo diarístico, situado entre 6 de Novembro de 1915 e «pelas seis e meia da tarde» e 11 de Novembro desse mesmo ano, «pelas sete da tarde», o que João Bigotte Chorão [23] denominou uma «identificação do criador com a criatura», a exigir que o autor se explique, demarcando-se do escrito, com a nota preliminar: «este livro não é uma biografia histórica. É uma obra de imaginação. É uma ficção. Um romance».

Clara Rocha, na recensão crítica que fez da obra para a revista Colóquio [24] notaria que nesta narrativa biográfica «o biógrafo também se retrata neste retrato de outrem» e há, de facto, algo de premonitório neste escrito relativamente à sorte de António Quadros.

Na entrevista a Antónia de Sousa, António Quadros diria: «Eu identifico-me muito com a personagem do Sampaio Bruno, sobretudo no campo do pensamento, mas há ali um drama humano que a mim me tocou profundamente».

História dolorosa, história de conversão religiosa para uma religião feita de inteligência a pôr na boca de Bruno estas palavras:

«Deus não tem poder para intervir directamente no tecido da vida, do cosmos e da humanidade que Ele criou, mas d’ele emanaram. Nós, todo o meio heterogéneo, humanos, animais, vegetais, minerais, somos irmãos e, procedermos por igual da degenerescência de Deus, e o que Ele deseja é de facto, sem violar a nossa liberdade, que, todos nós juntos, trabalhemos para regressar ao Uno que ele era ao princípio, ao Homogéneo que Ele era e será no fim dos tempos».

Enfim, a paixão por Fernando Pessoa, lançada no livro cujo manuscrito estou a transcrever para que seja editado em Julho, no Congresso comemorativo dos cem anos do seu nascimento.

As palavras são de Raquel Nobre Guerra [25]: António Quadros é um leitor integral de Fernando Pessoa. Neste contexto surgiria o romance que não chegou a editar A Paixão de Fernando P.

Trata-se, aliás, no que a este livro respeita, da passagem ao acto de uma presença obsessiva a do poeta da Mensagem que António Quadros estudou com intensa proximidade. Como revelaria, uma vez mais na entrevista final:

«às vezes chego a pensar que o Fernando Pessoa é uma presença de que não me posso livrar».

Presença permanente, a de Fenando Pessoa, nos seus estudos literários, António Quadros escreveria, a convite de Fernando Namora, uma biografia de Pessoa para a Editorial Arcádia, vinda a público em 1960 a que se seguiria, já em 1984, para as Publicações Dom Quixote o livro Fernando Pessoa, vida, personalidade e génio.

Editaria para as Publicações Europa-América, prefaciando-a, uma parte substancial da obra pessoana, a que se somariam os três volumes de compilação que prepararia em 1986 para a Lello, em parceria com Dalila Pereira da Costa.

A Paixão de Fernando P. é um romance espelho, construído sobre a complexa relação amorosa de Fernando Pessoa com Ofélia Queiroz, tia do poeta Carlos Queiroz, cuja conversação epistolar nos foi legada como um documento extraordinário, desnudando a faceta mais íntima do poeta e, afinal, a mais expressivamente inconsequente.

De uma relação complexa se tratou que tem suportado distintas e, por vezes, boçais interpretações, mas que propiciou estudos de profundidade sob ângulos diversos.

António Quadros, projecta-se sobre essa outra sua figura, avulta ali a tensão entre o desejo de vida e o dever de uma obra, entre a volúpia erótica da carne, o carinho meigo do amor e «os deuses que não perdoam», juízes de uma Lei que, é afinal, a sua missão como enviado angélico a esta Terra. E por ora mais não direi.

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Enfim, o poeta. Foi aí que tudo começou, foi aí que tudo terminou.

Foi com Além da Noite, editado em 1949 e Viagem Desconhecida, publicado três anos depois, que António Quadros nos ofereceu a sua poesia. Em 1966 publicaria as odes Imitação do Homem. Em 1980 daria à estampa Ó Portugal Profundo e, enfim, em circulação restrita em 1991 as Trovas para o Menino Imperador no Dia de Pentecostes, com segunda edição em 1998.

Na entrevista derradeira a Antónia de Sousa, a que já nos referimos, confidenciava, optimista com a morte ali tão próxima: «também estou a pensar editar um livro de poesia que, de certo modo, é um repositório do meu pensamento e dos meus valores e que está esgotado há muitos anos».

Além da Noite, são trinta e três poemas, com ritmo, estilo, extensão e natureza entre si diferenciados.

Alguns pungentes, como Vem Noite, dedicado a sua mulher:

«Vem noite,/Vem docemente afagar a minha alma…/Que todo este horror desapareça!/Lágrimas, soluços, tristes e longos beijos,/A tua máscara filha, os teus olhos fixos/De quem viu a morte. Vem noite/A minha filha morreu e eu quero dormir, Quero sonhar com esses dias em que ignorava a morte. Não chores, meu amor! Espera/Pela noite! Iremos os dois de mão dada/Pela estrada fora. Lá no fim, a nosso filha/Aguarda-nos. Lá no fim, a nossa filha sorri…/Vem noite,/Vem docemente afagar a nossa alma…»

Outros, breves e tristes como a Poesia Triste:

«Uma sensação de lua nos meus membros estendidos/Uma aragem cinzenta/Uma aragem fria/Uma aragem morta/Na minha cabeça/Nos meus ouvidos, nos meus olhos embaciados»

Ou este de lírica contida, intitulado Ser, de que cito a primeira estrofe:

«Começo para além do meu sorriso,/Onde morrem as dores e as alegrias./Começo para além do meu sonhar,/Onde findam os ódios e os afectos […]

Ou esta quase ode, denominada Não Quero, em registo proclamatório:

«Vem até mim um cheiro avassalador/Um irresistível vento brutal que me quer arrastar aos/Tombos./Sinto nele águas estagnadas e pântanos sem fundo/Ao lado dos mais belos poemas do mundo./Sinto nele todas as ideias pensadas/E todos os sentimentos experimentados./Sinto nele toda a diversidade da vida/E todo o mistério da morte./Ah! Finco desesperadamente os pés à terra/A tudo o que é material e sólido/Agarrro-me, agarro-me/Porém o gigantesco cheiro das mil tonalidades/Tem uma potência cujo mistério não alcanço./Sinto-me sugado pelo vento da vida e pela morte […]»

Uma Viagem Desconhecida, colectânea em cinco partes, ilustrada por Martins Correia, é melancolia tornada poética, que não é possível sintetizar neste breve tempo que é o razoável concedido para uma conferência, mas de que deixo dois breves excertos entre tantos possíveis.

Assim de Os Sinais:

«Canto o silêncio, no silêncio infinitamente profundo e assustador da minha alma/ignorada saudade de um paraíso perdido, onde tudo foi tão simples e puro, que nada gemeu ou chorou, tropismo surdo e cego de uma vida para lá desta vida e desta morte – ambas tão próximas e conhecidas – os cânticos dos anjos apenas se ouvem nos corações aflitos […]

Ou este, paradoxalmente intitulado O Sexo, inserido numa trilogia a que chamou O Amor:

«O mar e a terra, a montanha e a planície/As árvores e os frutos, os animais e os homens/E ainda todas as forças esparsas no universo/Que sopram tempestades e despertam cataclismos/E ainda os ecos dos problemas insuperados/E dos mistérios indizíveis e individizíveis/E ainda as aparências transcendidas/E as raízes percorridas até ao fim,/E as almas ausentes/E a matéria presente/Tudo quanto existe e se separa/Tudo quanto é agitado pelo sopro divino/Se põe a cantar num coral maravilhoso e breve»

Em A Imitação do Homem, oferece-se uma lírica esperançosa, como na Ode à Alegria: «Na hora matinal do ser,/a face diurna/no tempo da infância/eu canto a alegria, eu canto a alegria./Alegria de estar vivo/e ser a seiva a brotar/e ser a vida a brotar/e ser o impulso viril/que abre os caminhos, que sobe as montanhas,/que descobre outra vez o que já fora esquecido/que refresca, que renova, que retoma/e dá o passo que ainda não fora dado».

Mas também a realidade imanente do movimento e de sonho, característica essencial do seu modo de conceber, a quem dedicou uma das odes, intitulada precisamente Ode ao Movimento, dedicada a Álvaro Ribeiro: «Sonhei que do sonho de um sonho despertava. que subitamente todas as coisas se moviam, que lá dentro os meus filhos corriam/e que a minha alma do corpo enfim se libertava. Ó movimento,/ó subtil energia,/oculta alegria/de não ser objecto ou coisa,/de ser perene viagem,/jamais fixada imagem,/euforia de ser para caminhar,/de ser para atingir/o porto que ninguém sabe».

Ó Portugal Profundo, brevíssima obra de doze poemas, é claramente uma obra sentida em nostalgia por sobre o fim do Império português o «meu Portugal que foste, que foste grande no mundo», um Portugal «adormecido», mas construído com desejo de que o seu amado ente pátrio abra as asas, abra as velas, revele o seu «ser profundo», porque «pr’a morreres ainda é cedo, ainda não o quer a sorte».

Estão aí, irrompendo em tanta estrofe, as ideias-mestras do pensamento de António Quadros, a sua patriosofia, ao rememorar o país que «na proa das tuas barcas/Levaste uma pomba branca/O divino Espírito Santo/Tiveste como alavanca», ao esperar que «Portugal, somos ainda,/Porque a semente que outrora/Germinou em terra ingrata/Há-de reviver agora».

Convocando uma ideia de Portugal ser profundo, ente outro, primordial, subsistente para daquele em que este Portugal se tornou, Quadros proclama: «Ao perder-nos de nós próprios,/É a matéria triturada/De que por razão e graça/Nascerá uma nova alvorada//Ó Portugal ser profundo,/Parte à conquista daqui;/Há um outro que esqueceste,/Um outro dentro de ti».

E eis 1991. Como o salientou António Cândido Franco na sua nótula final às Trovas para o Menino Imperador no Dia de Pentecostes:

«[…] o Deus de que se fala nas quadras – esse que não distingue entre materialistas e espiritualistas, entre ateus e crentes – não é o Deus dos exércitos, dos ministérios, das empresas, das escolas, das igrejas e de todos aqueles lugares que fazem da vida uma prisão estreitas de conveniências, preconceitos, agressões, títulos e interesses pessoais […] o Império de que aqui se fala nas quadras não é o Império dos militares, dos políticos, dos economistas ou dos padres, o Império dos vários imperialismos mundiais que ao mundo só tem dado, desde Roma, armas, torturas e escravidão […] o Portugal de que aqui se fala não é o Portugal da Reconquista, que só existiu nos maus livros que nos deram a ler na infância, nem o da expulsão dos judeus e mouros, que existiu mesmo para tristeza nossa, nem ainda o da ganância e das almas cativas, que ai está não sei se para vergonha ou lição nossa».

Está ali, dito em forma poética, todo o António Quadros. Se da sua obra houvesse apenas um livroa ser lido, atrevo-me a dizer, seria esse.

  



[1] António Quadros, Homem Vertical, publicado na colectânea António Quadros, Obra, Pensamento, Contextos, coordenação de Manuel Cândido Pimentel e Sofia Alexandre Carvalho, edição da Universidade Católica.

[2] Memória de António Quadros.

[3] António Quadros, Homem Vertical, publicado no citado livro António Quadros, Obra, Pensamento, Contextos.

[4] Palavras Finais, em Sabatina de Estudos da Obra de António Quadros, editado pela Fundação Lusíada em 1995

[5] António Quadros, Colecção Atlântica, edição do Instituto de Filosofia Luso-Brasileira, 1993.

[6] Síntese da Sabatina, publicado na Sabatina de Estudos da Obra de António Quadros.

[7] Evocação, em António Quadros, 1993.

[8] O Pensamento de António Quadros: da Estética Existencial à Filosofia Escatológica da História, artigo publicado na colectânea Deus, o Mal e a Saudade, Fundação Lusíada, 1993.

[9] E à teoria do mito na obra de António Quadros dedicaria António Braz Teixeira um estudo no seu livro A Teoria do Mito na filosofia luso-brasileira contemporânea, publicado pela Zéfiro em 2014. António Quadros escreveria, como tese de licenciatura, um ensaio denominado O Génio Nacional na Arquitectura Portuguesa, que em 1952 estava já fora do mercado mas que teria uma recensão crítica de Orlando Vitorino, publicada na Atlântico: revista luso-brasileira, 3ª série, n.º 2, 15 de Dezembro de 1949 .

[10] Síntese da Sabatina, citado.

[11] Entre todos os que colocaram o tema, cito Manuel Antunes no artigo Haverá Filosofias Nacionais, que fez publicar na revista jesuíta Brotéria, em 1957 [volume LXIV.

[12] Cito da interessante tese de João Ferreira, franciscano, Existência e Fundamentação Geral do Problema da Filosofia Portuguesa, editada pela Editorial Franciscana, em Braga, 1957, página 29.

[13] A Arte de Continuar Português, ensaios de história e filosofia, Edição Templo, 1978.

[14] A quem dedicaria um estudo: Delfim Santos – introdução à vida e obra, octogésimo aniversário, edição do Centro Cultural Delfim Santos, Lisboa, 1990.

[15] O Pensamento Português Contemporâneo, 1960-2010, edição da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2011, páginas 552-555.

[16] Intitulado A cultura portuguesa perante o existencialismo.

[17] Ante o existencialismo heideggeriano, Quiles sustentava, em crítica àquele, o in-sistencialismo, a projecção decorrente de ser estar em si mesmo e não enquadrado numa existência que lhe é exterior.

[18] Memória de António Quadros, publicado na Sabatina de Estudos da Obra de António Quadros, publicado pela Fundação Lusíada, 1995.

[19] O Pensamento de António Quadros, citado.

[20] António Quadros e a Filosofia, publicado na Sabatina de Estudos da Obra de António Quadros

[21] Tudo expressões retiradas dessa entrevista.

[22] De seu nome José Pereira de Sampaio [“Bruno” o pseudónimo”], surge referido apenas referido, nos momentos íntimos do relato, pelo primeiro nome, e formalmente pelo primeiro dos apelidos, «Dr. Pereira».

[23] Memória de António Quadros.

[24] Colóquio, números 123/124, Janeiro de 1992.

[25] António Quadros, Obra Pensamento, Contextos, citado.