4.7.21

António Telmo: contos, crónicas e teatro

 


Tenho de ser honesto e dizer que o livro é desigual, como sucede com todos quantos tentam compendiar a obra integral de quem seja - e este é o volume quinto, como todos publicados pela Zéfiro - e, por isso, os adjectivos de apreço não podem ser generalizados, sendo justos, porém, em relação ao essencial que no volume se publica.

Para além disso, o título, na parte em que refere "contos" não tem correspondência com o que são crónicas  e esboços teatrais que nele também se compilam e naquilo em que convoca o vocábulo "secreto" tem fundamento na vertente esotérica e cabalísticas do pensamento filosófico do seu autor mas não confere com alguns dos textos, em que, salvo ignorância minha ou desatenção, a interpretação não tem de ser decifrada.

Trata-se, sim, do tema que dá mote a um dos capítulos do livro, o inicial, onde ficam treze contos, a que se juntam [páginas 151 e seguintes] outros contos e escritos afins.

Posto isto, a sua leitura tem proporcionado bons momentos e, sobretudo, intervalos de reflexão. 

Tenho lido de modo errático, um pouco ao sabor do que os títulos prometem e do que é a disposição emocional do momento. Falta-me o teatro, os esboços de peças "A Goga" e "A Venda dos Painéis", este último, como refere Miguel Real na sua apresentação ao livro «texto duplamente iniciado e sempre inconcluso». 

António Telmo criou a personagem Tomé Natanael, anagrama do seu próprio nome e deu-lhe tal verosimilhança que se tornou necessário explicar que o antiquário de Estremoz, que ele figurava, não existia salvo na sua escrita.

E foi ele que configurou um dos seus livros,  "O Bateleur", o primeiro arcano das cartas do Tarot de Marselha, o representativo da letra Aleph, símbolo da magia.

Para o conhecimento do pensamento de António Telmo, naquilo em que resultou do primeiro impulso de Álvaro Ribeiro - o dilecto discípulo de Leonardo Coimbra - e de José Marinho - o leitor terá de fazer o caminho complexo dos seus livros, como, por exemplo, a "História Secreta de Portugal" ou, pela linguística a "Gramática Secreta da Língua Portuguesa", e não ficar por aí.

O esforço de lhe restituir visibilidade, em que se distingue pelo amoroso empenho, Pedro Martins e quantos animam o projecto tenta vencer o anátema que António Cândido Franco havia constatado em 1999 em artigo publicado no JL: «Hoje com mais de setenta, o autor passa por ser um caprichoso esotérico, quando não um perdulário que desperdiça em charadas e horóscopos a inteligência que Deus generosamente lhe confiou [...]» [para mais, ver aqui].

Tive, em tempo, quando fui editor, a oportunidade de publicar o seu epistolário com António Quadros, amplamente comentado e guia também, por isso, útil para conhecimento da parte em que a Filosofia Portuguesa os irmana.

Vou prosseguir com os contos. Acompanho Pedro Sinde, no que publicou nos "Teoremas de Filosofia", esses doze fascículos que consegui reunir: «O conto é, tantas vezes, a melhor forma de transmitir doutrina, porque aí os conceitos são obrigados a sair do mundo noético do espírito quase puro para incarnarem, como o Verbo exemplar, e ganharem vida terrena».