12.2.06

A angústia do amor

Adolfo Casais Monteiro traduziu para português «O desespero humano» de Sören Kirkegaard. Dedicou o trabalho a Leonardo Coimbra. Encontrei agora o livro, tirado em 1936 pela Livraria Tavares Martins, num monte de velharias amarelecidas, a cinco euros cada. Dentro, guardada por algum seu leitor, a cinta vermelha que guarneceria a obra, resumindo-a como «o desespero das almas que não querem abandonar-se à misericórdia e ao perdão de Deus». Não vou ter tempo de o ler tão cedo, mas lembrei-me esta noite de ter lido sobre quem tivera um papel primordial na conversão de Leonardo: o Padre Cruz. Procurei recordar onde o lera e encontrei-o, um breve artigo de Pinharanda Gomes, arquivado nas Actas de um Colóquio que se chamou «As linhas míticas do pensamento português». Estava entre os livros que, aqui por casa, haverão de voltar para a estante, quando houver mais estante. Folheei-o agora, para me deter numa carta que o Padre [Francisco Rodrigues da] Cruz escreveu a Leonardo em Dezembro de 1935 e onde a certo passo cita Santo Afonso: «quem quer o que Deus quer, tem tudo quanto quer». Ora Deus quis que este homem se convertesse, ele não quis outra coisa que esta conversão. Desesperado, tinha então um filho a morrer. A fé surgiu-lhe na angústia do amor.