12.9.05

O bicho de conta

O Jorge de Sena, que era um obsessivo excessivo, fosforou num dia de 1964 a seguinte fórmula 5 px8 v+4 px12 v+5 px16 px17 v+7 px20 v+6 px24 v: 5+4+5+6+7+6. Resultou isto de ter dissecado, como se cadáver fora, a obra poética - imagine-se - do António Gedeão e ter observado que «em resumo geral dos três livros, os 90 poemas têm extensões que variam entre 4 a 108 versos por poema, e há, para eles, descontadas as coincidências extensivas, 45 extensões diferentes entre aqueles limites extremos». Só que, continuou Sena «segundo o quadro geral que, por muito vasto não transcrevemos aqui, 40 dos poemas têm extensões entre 8 versos e 24 versos, sendo perfeitamente excepcionais as extensões acima dos 80 versos, e abaixo de 8». Ou seja, remata Jorge: «como se depreenderá facilmente, apesar de o poeta experimentar dimensões tão diversas e numerosas, todavia ele se fixa, para 44% dos seus poemas, em extensões cujos valores extremos são aproximadamente a média dos limites mínimos dos três livros, para o valor mínimo, e metade do menor dos máximos, para o valor máximo». Quatro anos depois, o homem voltou à carga, com mais contas. Ora um tipo lê isto e sente ganas de andar aos murros, sacando o poeta agonizante à mão dos seus críticos e analistas, sobretudo amigos, sobretudo contadores. E não me digam que eu não gosto do Sena! Incapaz de sentimentos indiferentes, adoro em parte, odeio o resto.Tenho é amor ao Gedeão, em movimento perpétuo.